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14.7.08

Via todos esses vultos e rostos ligados entre si por milhares de relações, cada qual a acudir o outro, a amá-lo, a odiá-lo, a destruí-lo, a pari-lo de novo. (...) E todos esses rostos repousavam, flutuavam, geravam-se mutuamente, esvaíam-se e confundiam-se.
Sidarta [Herman Hesse]

26.5.08

Ya las lustrales aguas de la noche me absuelven de los muchos colores y de las muchas formas. Ya en el jardín las aves y los astros exaltan el regreso anhelado de las antiguas normas del sueño y de la sombra. Ya la sombra ha sellado los espejos que copian la ficción de las cosas. Mejor lo dijo Goethe: Lo cercano se aleja. Esas cuatro palabras cifran todo el crepúsculo. En el jardín las rosas dejan de ser las rosas quieren ser la Rosa. La tarde Las tardes que serán y las que han sido son una sola, inconcebiblemente.
La joven noche [Borges]

19.5.08

Tenho uma tigelinha azul que nasceu aqui em casa. Antes, só tinha uma grande ― esta, adquiri já adulta. Deve ter chegado grávida, pois a outra surgiu sem aviso, minúscula, emborcada num canto de prateleira. O mesmo azul transparente, a mesma aba na borda. Estranhei o tamanho a princípio, pois nela não cabia sequer um terço das pipocas que cabiam na outra. Mas como não sou de dar crédito à memória, convenci-me tratar-se da antiga. Afinal, até a aba na borda era idêntica. Para minha surpresa, meses depois encontrei a mãe toda empoeirada dentro de um armário. Procurei a menor e só tirei a prova quando vi as duas na mesa, dispostas lado a lado. Agora elas vivem juntas, uma dentro da outra. Estranho a pequena não ter crescido mais. Deve ser anã, por isso ficou assim tão miúda.
Tigelas azuis transparentes [David Pádua]

12.5.08

Cada vez gosto mais de ler essa moça.

18.3.08

... que às vezes se possa dizer que é doce não contradiz sua violência; muitos dizem que o açúcar é doce; mas eu o acho, o açúcar, violento.
[Roland Barthes]

5.2.08

Então, que seja doce. Repito todas as manhãs, ao abrir as janelas para deixar entrar o sol ou o cinza dos dias, bem assim: que seja doce. Quando há sol, e esse sol bate na minha cara amassada do sono ou da insônia, contemplando as partículas de poeira soltas no ar, feito um pequeno universo, repito sete vezes para dar sorte: que seja doce que seja doce que seja doce e assim por diante. Mas, se alguém me perguntasse o que deverá ser doce, talvez não saiba responder. Tudo é tão vago como se fosse nada.

Os dragões não conhecem o paraíso [Caio Fernando Abreu]

2.12.07

Era uma vez um monstro que desejou ser um homem. Esse era um monstro muito esperto -- e também muito obstinado -- de modo que em pouco tempo já conseguira moldar seu corpo no feitio de um homem. "Agora sou um homem" pensou. E era uma pessoa completa: mesmo os dedos dos pés tinham unhas e ele não esquecera nem daquela carninha vermelha no canto dos olhos nem dos dentes lá de trás.

Parecia mesmo um homem completo. Mas que tipo de homem ele era? Isso ele ainda não sabia. Isso não tinha resolvido. Resolveu então o monstro -- já travestido de homem -- observar os homens. Com sua nova pele misturou-se às pessoas nas ruas e constatou feliz que seu disfarce não era percebido. Pôs-se a estudar os vários tipos de gentes, de modo a decidir qual melhor lhe servisse. "Sou um homem jovem" raciocinou, "não me cabem os modos de um velho ou de uma mulher."

Então, esquecendo-se de que não tinha pais (uma vez que não era uma pessoa de verdade) desejou ser um jovem de quem os pais se orgulhassem. Tornou-se então um amante do conhecimento, aplicou-se aos estudos e se fez um filho exemplar -- ou teria sido um filho exemplar se fosse filho de alguém que não ele mesmo. De todo modo, os mais velhos o admiravam e perguntavam a seus filhos por que não eram como o monstro. Mas os filhos, os jovens, esses não lhe davam importância e riam-se dele. Ele tinha o respeito dos velhos mas ele era um homem jovem e isso não bastava.

Então ele desejou ter amigos. E da mesma maneira que moldara seu corpo monstruoso na forma de um homem, ele agora moldaria seu caráter na forma de um jovem popular. Tornou-se assim festeiro e freqüentador dos mais diversos círculos. Fez inúmeros amigos e conquanto hoje os velhos o considerem má influência, os filhos destes o adoram e procuram sempre sua companhia. Se o monstro tivesse pais, eles estariam desconsolados.

Mas um dia também este brinquedo o cansará, como o cansaram outros. Pois antes de ser gente o monstro foi muitas coisas e nenhuma delas o satisfez por muito tempo. Muitas coisas o monstro já foi e muitas coisas será e o que lhe enfada é mesmo ser monstro. Mas destino do monstro é não ser coisa alguma. O destino do monstro é ser monstro.

Um Monstro [Juliana Coelho]

22.10.07

E se me achar esquisita, respeite também, até eu fui obrigada a me respeitar.
[Clarice Lispector]

1.10.07

lo cercano se aleja [Goethe]

15.7.07

Olha só, que cara estranho que chegou
Parece não achar lugar
no corpo em que Deus lhe encarnou
Tropeça a cada quarteirão
não mede a força que já tem
exibe à frente o coração
que não divide com ninguém
Tem tudo sempre às suas mãos
mas leva a cruz um pouco além
talhando feito um artesão
a imagem de um rapaz de bem
Olha ali quem está pedindo aprovação
Não sabe nem pra onde ir
se alguém não aponta a direção
Periga nunca se encontrar
Será que ele vai perceber
que foge sempre do lugar
deixando o ódio se esconder
Talvez se nunca mais tentar
viver o cara da TV
que vence a briga sem suar
e ganha aplausos sem querer

Faz parte desse jogo
dizer ao mundo todo
que só conhece o seu quinhão ruim

É simples desse jeito
quando se encolhe o peito
e finge não haver competição

É a solução de quem não quer
perder aquilo que já tem
e fecha a mão pro que há de vir

Cara Estranho [Marcelo Camelo]

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